Desde ontem, os 8 mil médicos responsáveis pelos exames de motoristas no País devem tornar mais rígidas as avaliações para quem vai tirar ou renovar a Carteira Nacional de Habilitação (CNH). As mudanças serão detalhadas em um seminário que a Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet) promove na capital, no sábado, e tomam por base uma portaria do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran). O objetivo das mudanças é atacar as causas dos acidentes provocados por doenças ou problemas físicos dos motoristas, como hipertensão e deficiências cardíacas, sono em excesso e dificuldades auditivas - condutores profissionais, por exemplo, terão de passar agora por avaliações específicas (veja texto abaixo). De 1 milhão de acidentes que ocorrem por ano no Brasil, de 60 mil a 80 mil têm alguma causa física do motorista, segundo estimativa da Abramet.
Pela Resolução 267 do Denatran, que revisa determinações feitas há dez anos (mas que nunca foram discriminadas em detalhes como agora), os condutores ou candidatos a tirar a CNH de todas as categorias terão de passar por avaliações cardiológicas, auditivas, neurológicas e oftalmológicas. Também é obrigatório preencher um questionário com dez perguntas - incluindo se a pessoa faz uso excessivo de álcool, drogas, se já sofreu acidentes, se tem diabetes, toma remédios ou faz tratamento de saúde. Respostas falsas, se comprovadas pelo envolvimento posterior do motorista em um acidente por uso de drogas, por exemplo, implicarão responsabilidade criminal, conforme prevê o Código Penal.
APTIDÃO
Dependendo da avaliação, um condutor pode ser considerado apto, apto com restrições (nesse caso, pode ser obrigado a passar até por avaliações anuais para renovação da CNH), inapto temporário (por causa de pressão alta, por exemplo) ou inapto. Uma das inovações que será posta em prática, segundo o presidente da Abramet, Flávio Emir Adura, é uma prova de capacidade auditiva. O examinador deverá pronunciar palavras a 2 metros de distância, sem que o candidato o veja, e este deve repeti-las. “Se houver dificuldade, o motorista terá de fazer um teste audiométrico”, disse o especialista.
Segundo Adura, a avaliação cardiorrespiratória vai envolver a medição da pressão arterial e análise do coração e pulmões para a detecção de risco de enfarte, arritmia e insuficiência cardíacas. Diante de qualquer suspeita, o perito poderá solicitar exames do candidato ou então conceder a CNH com um prazo de validade menor - por exemplo, um ou dois anos.
“Outra novidade foi o estabelecimento dos níveis de pressão arterial máximos para a habilitação”, afirmou Adura. “Motoristas com pressão acima de 18 por 11 serão considerados temporariamente inaptos.”
Mudaram também os índices mínimos de acuidade visual e campo de visão necessários - nesse caso, para menos. “Pesquisas internacionais mostraram que os limites anteriores, os mesmos há 40 anos, eram altos e a diminuição não compromete a segurança do trânsito”, disse o presidente da Abramet. Para a categoria B (carro), por exemplo, anteriormente era exigida acuidade mínima de
66% em cada olho. Esse índice baixou para 50%.
Na parte dos exames neurológicos - já existentes -, que avaliam mobilidade, coordenação motora, força e sensibilidade, há também uma inovação: epiléticos poderão tirar a carteira. Para isso será feita uma avaliação específica.
Para o especialista em trânsito Luiz Célio Bottura, do Instituto de Engenharia, as medidas são importantes, mas não pode haver recuos. Ele citou como exemplo a adoção da Lei Seca, que impediu a venda de bebidas nas estradas federais, em vigor desde o dia 1º. “Primeiro lançaram uma medida enérgica, logo após a explosão de acidentes no ano-novo. Depois, começaram as exceções: os supermercados querem vender, os restaurantes também. Antes de qualquer nova medida, é preciso antes que se cumpra o que já existe. É uma iniciativa boa criar regras mais rígidas para a retirada ou renovação da CNH. Mas é preciso ter profissionais qualificados para fazer a orientação”, disse Bottura.
“Os exames auditivos, por exemplo, já eram previstos desde 1997. Agora, é muito interessante avaliar um eventual distúrbio do sono do candidato a motorista”, afirmou Jurandir Fernandes, presidente do Denatran quando se definiram as mudanças no exame da CNH que se seguiram ao Código de Trânsito Brasileiro (CTB). “O problema é que não existe no País um corpo médico qualificado para suprir um crescimento exponencial da demanda de pacientes que essa regra deve gerar.”
FONTE: Jornal O Estado de S. Paulo |